Quando uma SMS fez o comprador perder tudo o que tinha pago pelo imóvel
- Victoria C L Diez
- 3 de mai.
- 3 min de leitura
Um dos pontos mais importantes de uma transação imobiliária é o processo adotado por quem a intermedeia. A condução adequada de um procedimento seguro e documentado deve ser regra para corretores que desejam se resguardar de futuras responsabilidades e, ao mesmo tempo, garantir a proteção jurídica das partes envolvidas na negociação.

O cotidiano corrido do corretor e os riscos por trás dele
A rotina do corretor de imóveis é marcada por um dinamismo intenso. São múltiplas negociações acontecendo ao mesmo tempo, propostas sendo elaboradas, visitas agendadas, documentos trafegando e orientações sendo repassadas continuamente.
Nesse contexto acelerado, nem sempre há tempo ou estrutura para organizar as comunicações, mas é justamente aí que mora o risco.
Conversas aparentemente inofensivas, se não forem devidamente registradas, podem se voltar contra o corretor — ou contra uma das partes — no momento do fechamento do negócio, ou até mesmo em caso de litígio futuro.
Um caso real: o SMS que virou prova determinante
Em um julgamento analisado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), a prova que garantiu a vitória de uma das partes foi uma simples mensagem de texto via SMS enviada ao corretor.
No caso, os compradores estavam enfrentando dificuldades para cumprir com o pagamento das parcelas de um imóvel avaliado em cerca de R$ 1,6 milhão. Propuseram, então, a inclusão de uma cláusula penal no contrato, via aditivo, estabelecendo que, em caso de inadimplemento, os valores pagos seriam integralmente retidos pelos vendedores.
A mensagem foi enviada ao corretor e comprovava que essa sugestão partiu dos próprios compradores.
O julgamento: do Tribunal local ao STJ
Na primeira instância, a Justiça do Distrito Federal entendeu que a cláusula penal era nula, e determinou a devolução parcial dos valores aos compradores, com os devidos abatimentos (como comissão de corretagem e multa adequada).
Contudo, os vendedores recorreram e obtiveram vitória no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que reconheceu a validade da cláusula, amparado justamente na prova da mensagem de texto.
O caso ainda chegou ao STJ, onde os compradores tentaram, sem sucesso, reduzir a penalidade para 10% a 25%. O STJ reafirmou a importância da boa-fé objetiva e da coerência de conduta ao longo do contrato, destacando que os próprios compradores haviam solicitado a inclusão da penalidade que depois passaram a contestar.
Assim, o comportamento contraditório não poderia ser validado.
O que esse caso ensina aos corretores de imóveis?
Esse julgamento mostra com clareza que registrar conversas e guardar mensagens pode fazer toda a diferença em um eventual litígio. Ainda que não haja um contrato assinado naquele momento, as trocas de mensagens eletrônicas têm valor jurídico e podem ser decisivas em disputas contratuais.
Além disso, o caso evidencia a importância de:
Formalizar todas as sugestões e alterações contratuais por escrito;
Armazenar as comunicações com segurança e validação de idoneidade, mesmo que pareçam triviais;
Adotar critérios claros para inclusão de cláusulas específicas, como as cláusulas penais, sempre com respaldo documental.
Mais do que prudência: é uma questão de responsabilidade profissional
O corretor não pode ser apenas um intermediador informal, ele deve agir com autoridade profissional. Diante da complexidade dos contratos e da responsabilidade que seu serviço envolve, a adoção de boas práticas na gestão da documentação e comunicação é parte essencial de sua atuação.
Mesmo quando uma cláusula parecer desequilibrada aos olhos do corretor, como no caso acima, o fato de haver manifestação expressa da parte contratante pode ser suficiente para que ela se mantenha válida — e isso só será possível se houver prova concreta dessa manifestação.
Conclusão: registre tudo, mesmo o que parece pequeno
O registro das conversas, das propostas e das decisões tomadas ao longo da negociação é fundamental para garantir segurança jurídica à operação, proteger o trabalho do corretor e evitar surpresas no futuro.
A profissionalização da atuação dos corretores passa também pela organização documental, e mensagens de texto, e-mails e prints podem ser tão importantes quanto o contrato assinado.



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